"Um blog que discorre sobre cristianismo, apologética, cinema e outros assuntos desinteressantes..."



quinta-feira, 17 de outubro de 2013

Razões para não cooperar

Por Wagner Amaral

“Não deixemos de congregar-nos, como é costume de alguns; antes, façamos admoestações e tanto mais quanto vedes que o Dia se aproxima” (Hebreus 10.25).

Que motivo levaria o autor aos hebreus a fazer tal exortação? Evidentemente, o fato de alguns, por razões diversas, não congregarem. Pois bem, quais seriam as razões para o afastamento? Você consegue enxergar razões para o afastamento, e a não cooperação? O que levaria ao esfriamento espiritual?

Há razões aceitáveis, e recomendáveis para o afastamento, como o desvio herético e doutrinário. Mas, até nesses casos, o afastamento deve ocorrer após sérias e corretas tentativas de mudança. Há, ainda, a razão de não se adequar ao estilo da igreja (sem nenhuma agressão aos princípios eclesiásticos expostos nas Escrituras); nesse caso o indivíduo deve mudar de igreja e não lutar para mudar a igreja.

Há as razões equivocadas para o afastamento, como o estar chateado com algum irmão (Mateus 18.15ss); ou o discordar da decisão da maioria (Atos 16.4-5; Filipenses 2.1-4); ou o discordar em algum aspecto da liderança (Hebreus 13.17); ou mesmo ter sido preterido em alguma escolha (Filipenses 2.5ss). Provavelmente algumas destas compunham as razões que levaram os hebreus a se afastarem do convívio da igreja. E, por isso, o autor da epístola os exorta, mostrando que não são razões aceitáveis para o afastamento.

Mas, quero destacar algumas das principais razões que levam crentes a se afastarem de suas igrejas; e, consequentemente, do Senhor.

1. Pecado.

Escondido, secreto, criado, alimentado, e não confessado ao Senhor. (Hebreus 3.12-13) Isto esfria a alegria, e faz a pessoa valorizar as falhas e erros, mesmo quando estas verdadeiramente não existem. Exemplos: (1) A pessoa tem inclinação à infidelidade, e, então, procura erros para não dar os dízimos e as ofertas. (2) A pessoa tem inclinação a não ser assídua e participativa, e então, procura razões para não estar sempre nas programações. Por que a pessoa age assim? Porque é uma forma de esconder, ou de diminuir seu próprio erro. É uma tentativa de enganar a própria mente. Por isso a exortação para renová-la (Romanos 12.1-2).

2. Hipervalorização do “eu”.

Quando a pessoa se vê superior às outras, e acha que merece ser priorizada quanto às suas sugestões, escolhas, etc. Quando a pessoa tem cuidado exagerado com sua imagem, e não admite ser preterida, crendo que assim está sendo exposta ao ridículo. Quando a pessoa tem dificuldade de convivência, não sabendo ouvir; mas exigindo ser ouvida. Não sabendo ajudar, contribuir; mas exigindo participação efetiva dos outros diante de algo que comanda. Encarando tudo como pessoal – se alguém foi contra a alguma ideia, é contra a sua pessoa; logo, muda, inclusive, sua forma de agir para com ela.

3. Imaturidade.

É quando a pessoa não tem razão específica, não tem sequer argumentos; mas é contra. Não se dá nem a experimentar aquilo que está sendo proposta; simplesmente é contra. O esquisito é que você pergunta o porquê, e as respostas normalmente são: porque é errado; não é bom; não é legal; vai atrapalhar; etc. Nada realmente com conteúdo e que processe reflexão para, quem sabe, uma mudança de rumo. E o pior é que tendem a ser exagerados, buscando fortalecer sua posição: Não dá certo, todo mundo acha; a igreja inteira, quando na realidade é ela, ou talvez mais duas ou três pessoas. (1Pedro 3.8-12).

4. Visão errada do motivo pelo qual vivemos, agimos e cultuamos.

“E tudo o que fizerdes, seja em palavra, seja em ação, fazei-o em nome do Senhor Jesus, dando por ele graças a Deus Pai. Tudo quanto fizerdes, fazei-o de todo o coração, como para o Senhor e não para homens” (Colossenses 3.17, 23). Nossa motivação é o Senhor. Não pode ser alguém, a instituição, ou a estrutura administrativa; pois, neste caso incorremos em dois erros: (1) Errar no alvo de nossa adoração e dedicação. (2) E certamente se decepcionar em algum momento, pois seres humanos, e tudo aquilo que criam possuem falhas. Dessa forma corre-se o risco de perder a motivação.


A maturidade espiritual está em não precisar de razões terrenas, falíveis e passageiras para adorar ao Senhor, servindo-o com dedicação. O meu servir, o meu dizimar, o meu ofertar, o meu congregar, o meu participar, tudo é minha forma de adorar ao Senhor; por isso, devo procurar fazer sempre o melhor, pois é para Ele.

segunda-feira, 14 de outubro de 2013

O que é um Fundamentalista (Ideal)?

Por Kevin T. Bauder

1) Fundamentalistas reconhecem que todas as doutrinas são importantes. Se a Bíblia ensina, vale a pena estudar e conhecer. Se Deus disse isto, o mesmo merece nossa cuidadosa atenção.

(2) Fundamentalistas afirmam que algumas doutrinas são mais importantes do que outras. Nem todo ensino da Bíblia é de igual alcance em seus efeitos. Enquanto todos são importantes, alguns estão mais ao centro enquanto outros se encontram na periferia da fé cristã.

(3) Fundamentalistas insistem que algumas doutrinas são tão importantes que são essenciais ao evangelho em si. Negar estas doutrinas é (pelo menos implicitamente) negar o evangelho. Negar o evangelho é transformar o cristianismo em alguma outra religião. Essas doutrinas essenciais estão no miolo, no centro, da fé cristã. Elas são o mínimo irredutível sem o qual não pode existir cristianismo.

(4) Fundamentalistas crêem que comunhão cristã é definida pelo próprio evangelho. Aqueles que negam o evangelho não devem ser reconhecidos como cristãos. Aqueles que negam o evangelho, ao condenar alguma doutrina essencial, não estão aptos para a comunhão cristã. Com tais pessoas, nenhuma comunhão cristã existe. Fingir que podemos desfrutar de comunhão cristã com tais pessoas é tão-somente ser hipócrita. Estender o reconhecimento cristão – particularmente reconhecer como líderes cristãos – a tais pessoas é desprezar o evangelho e enganar o povo de Deus.


(5) Fundamentalistas insistem que irmãos que desprezam o evangelho e enganam o povo de Deus são culpados de grave erro e deveriam ser removidos da posição de liderança cristã. Se tais pessoas não podem ser removidas da liderança, ainda assim os cristãos bíblicos tem a obrigação de não endossar ou apoiar as pessoas, organizações, e atividades que obscurecem a importância do evangelho e enganam o povo cristão, mas ao invés disto reprovar os tais.

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Star Trek Gospel: A Série



Digão

Admito que sou um nerd. Gosto bastante de ficção científica, de assistir a seriados de desenhos animados, cujos enredos discuto animadamente com gente do meu nível intelectual, o que no caso são minhas filhas de 5 e 8 anos. Não leio tanto gibi quanto gostaria, mesmo porque aqui em Rondônia não chegam essas coisas do capeta e, quando chegam, ou são muito defasadas ou muito caras, quando não são as duas coisas ao mesmo tempo.

Uma série que gosto muito de assistir é Star Trek. Série, não. Séries. Jornada nas Estrelas já pariu onze filmes, uma série de desenhos animados e 4 séries derivadas dentro do universo da Federação Unida dos Planetas (A Nova GeraçãoDeep Space 9Voyager Enterprise), além de livros e revistas em quadrinhos. E já assisti a todos, sem exceção.

Mas uma coisa que gosto também é de teologia. Lembro-me que, ao assistir a uma das séries, ficava me perguntando sobre o alcance do sacrifício da cruz no universo: seriam também os alienígenas pecadores necessitados do perdão de Deus, ou será que eles ainda não experimentaram a desgraça do pecado? Bom, depois a gente volta no assunto.

Mas estive pensando nesse nosso mundinho gospel comparado ao mundinho trekker. Sei que Gene Roddenberry, criador da série, era ateu e avesso ao cristianismo. Mas, ainda assim, quem sabe, podemos fazer um exercício de imaginação com os personagens da série original, que é a mais conhecida. Como seria se eles fossem membros de igrejas evangélicas?

Capitão Kirk: charmosão, sempre dava um vôo rasante em cima da mulherada. Sempre se dá bem, apesar de apanhar um bocado. E gosta de comandar, de um jeito bem “apostólico”, ou mesmo “patriarcal”. Acho que é um modelo de neopentecostal.

Spock: sempre lógico, o vulcano não apresenta emoções, que são contrárias à sua natureza, apesar de ser meio humano. Sempre resolve tudo na base da racionalidade. Tenho pra mim que Spock era calvinista.

McCoy: sempre reclamão, brigava o tempo todo com Spock. Sempre discutia também com o capitão. Surtou certa vez ao aplicar em si mesmo, acidentalmente, um composto medicinal (nem me perguntem o nome) no episódio A cidade à beira da eternidade (um dos melhores do seriado original, por sinal). Possivelmente um crente “alternativo”, desses que abominam igreja (mas que formaram uma só para si mesmos), e que estão sempre no caminho, mas ainda não chegaram à casa do Pai, ou mesmo a alguma conclusão lógica isenta de sofismas.

Uhura: a primeira negra a protagonizar um seriado sem estar no papel de empregada ou escrava. Tratava das comunicações. Não falava muito, mas era eficiente no que fazia. Um tipo de batistão.

Chekov: o garotão da turma. Sempre empolgadão, dizendo que todas as invenções importantes da humanidade eram, na verdade, de gente da Rússia, seu país natal. Como sempre dizia coisas do passado, mas ninguém dava bola para o que ele falava, talvez ele fosse presbiteriano independente mesmo.

Scott: o engenheiro chefe da Enterprise. Eficiente, gostava de conhecer a fundo a parte técnica da nave, mas não tinha muito tempo para curtir a viagem. De vez em quando ficava de porre com os uísques que tomava lembrando a Escócia natal. Talvez um membro de alguma igreja liberal.

Sulu: tentei pensar em alguma coisa pra ele, mas não consegui. Talvez por ele entrar mudo e sair calado dos episódios, ou por recentemente assumir a homossexualidade (o ator, não o personagem), ele seria algum GG (gospel gay). 

quarta-feira, 5 de junho de 2013

[APOLOGÉTICA] Um Corpo sem dono



Por Danilo Fernandes

O problema é que este movimento está criando uma divisão na sociedade entre os que são contra e a favor de certas práticas; gostam, ou não de certas coisas; vestem certas roupas, ou outras; comem e bebem estas coisas, ou aquelas outras; cantam assim, ou assado; vão a certos lugares, ou alhures. 

E a despeito do valor e das escolhas do que se pratique, goste, vista, coma, beba, cante ou se vá... Nada destas coisas são Cristo. 

E, assim sendo, o que deveria ser o corpo de Cristo, instrumento da Sua vontade, da Sua justiça, das Suas prioridades, etc. é outra coisa, muitas vezes,  envergonhando a Cristo.

O que devia ser luz para todos, são trevas.
O que devia ser sal, a dar sabor e sentido, se perde na forma e nunca chega aos fins.
E quem deveria ter fome e sede de justiça, come e bebe para sua própria jactância e deixa o oprimido à mingua.
E o que deveria servir, quer ser servido. 
E o que deveria apascentar, escalpela.
E quem deveria ser o socorro dos pequeninos é o primeiro a lhes humilhar.

Nos perdemos em nossas próprias divisões e travamos a nossa própria luta em nome de Quem não somos mais.

Queremos mostrar que somos muitos, marchar diante dos outros, mostrar o nosso poder e nem percebemos que desfilamos, tão somente, a nossa grotesca irrelevância.

Se o povo não nos recebe com palmas, nem nos perguntamos o porquê. Tratamos logo de conseguir que a Vênus Platinada se dê em elogios a nossa orgulhosa parada.
Perdemos a nossa identidade, que não é e nunca foi a NOSSA, morta na Cruz de Cristo para ser um corpo sem dono, que não é nem mais nosso e nem Dele. Não somos mais nada.

Fomos chamados a ser bem-aventurados (Mateus 5). 

E quem pensa fazer parte do corpo, que confira ali (Mateus 5), no bem-dito do Mestre, se vive no Corpo ou apodrece em si mesmo.

segunda-feira, 13 de maio de 2013

[APOLOGÉTICA] Evangelho verdadeiro sem sinais e milagres é possível?





Por André R. Fonseca


É muito comum encontrar legiões de crentes a busca de sinais e maravilhas. Boas igrejas são aquelas cheias do poder de Deus. Mas o que é demonstração do poder de Deus? Será apenas as operações de milagres?

É o culto que tira caroço, que expulsa demônios, cura as mais variadas doenças, entrega revelação, e até, quem diria, emagrece! O culto da vitória financeira, pobres que viram ricos empresários, dívidas pagas miraculosamente, portas abertas para as mais concorridas vagas de emprego. E para quem não dá muita trela para o dinheiro, mas anda mal do amor: Deus traz sua mulher amada em 3 dias!

Os batistas não têm poder, dizem eles. Eles não têm o Espírito Santo, não têm fogo. Vamos naquela igreja na qual o fogo cai e sinais e maravilhas acontecem! Vamos em busca do poder de Deus e suas manifestações...

O problema é que Jesus chama esse tipo de “crente” de geração incrédula. Apesar de os sinais acompanharem Jesus como prova de sua divindade, de sua missão messiânica, foi justamente esta a alegação de Cristo ao responder os enviados de João Batista: vocês não precisam esperar por “outro messias”, reportem a João que cegos veem, os coxos andam, os leprosos são curados, os surdos ouvem, os mortos são ressuscitados, e os pobres recebem o evangelho.

Os pobres recebem o evangelho... Aqui está uma resposta que ninguém dá atenção! O maior milagre de Deus hoje em nosso meio é o poder transformador do evangelho nas vidas das pessoas que se entregam a Cristo. A transformação do coração corrupto do homem pelo poder do evangelho por meio da ação do Espírito Santo é o maior milagre que pode acontecer diante de nosso olhos. Curar a alma é maior sinal do que curar a carne. Inimigos de Deus são feitos amigos, e quando Deus faz o homem caído cruzar esse abismo que o separa de Deus é um feito maior do que cruzar a Baía de Guanabara a pés secos à semelhança do que foi realizado nos dias de Moisés.

É possível ter evangelho verdadeiro sem sinais e maravilhas? É claro que é! Primeiro, porque precisamos redefinir o que chamamos de milagre e maravilha. O receber o evangelho é parte dos sinais maravilhosos do Messias. Ele mesmo nos ensinou que nossa fé deveria estar depositada naquilo que dura para a eternidade. A cura física, ou qualquer outro benefício desta vida, fica por aqui, e você pode até participar de algumas dessas bençãos e ainda ir para o inferno. Receber o evangelho tem valor para essa vida e para a próxima.

E segundo, para chegar onde queria chegar, somente a pregação cristocêntrica pode ser classificada como verdadeiro evangelho, ainda que desprovida de sinais e maravilhas!
“Ele voltou de novo para o lado leste do rio Jordão, foi para o lugar onde João Batista tinha batizado antes e ficou lá. E muita gente ia vê-lo, dizendo: — João não fez nenhum milagre, mas tudo o que ele disse sobre Jesus é verdade. E naquele lugar muita gente creu em Jesus.”João 10:40-42

terça-feira, 12 de março de 2013

[Cinema em Casa] PSICOSE II

(Psycho II, dir. Richard Franklin, 1983)

O texto abaixo foi escrito por mim mesmo em 2008 e ratifico-o palavra por palavra após ter revisto o filme ontem via Netflix.


OBSERVAÇÃO: O texto está cheio de spoilers. Veja o filme antes de lê-lo se não quiser estragar as reviravoltas. O texto recomenda a experiência de ter visto o filme para que possa ser melhor apreciado.
“Em 1960, a História do Cinema estava sendo escrita… Já se passaram 22 anos e Norman Bates voltou para casa.” Com essa tagline, a Universal inseriu o público dentro que se tratava Psicose II, a seqüência de um dos maiores clássicos não só do cinema, mas também de um dos melhores filmes da filmografia de Alfred Hitchcock. Não dá pra negar que a continuação foi proposta com o único intuito de pegar carona na onda “slasher” do terror que, em 1982, estava a todo vapor, produzindo filmes de terror em doses cavalares. Para se ter uma idéia, a série Sexta-Feira 13 tinha lançado seu terceiro episódio e já estava anunciando a produção de seu quarto; Halloween, por sua vez, também lançava seu terceiro episódio; Tubarão idem. “Por que não trazer de volta Norman Bates?” deve ter pensado um executivo do estúdio onde Hitch terminou sua prolífica carreira… Neste contexto mercantilista, a continuação teve sua produção iniciada, dirigida pelo desconhecido (e posteriormente amaldiçoado pela crítica) Richard Franklin, mas alguma coisa fez com que o filme deixasse de ser apenas mais um filme de suspense/terror para se tornar um complemento único à excelência que Hitch mostrou de forma tão saborosa no filme de 1960…
Psicose II é um filme sobre alguns assuntos. Um deles é sobre as mães e seus filhos (plural). Norman Bates (Anthony Perkins), tido como incapaz de compreender a natureza de seus atos, é condenado a cumprir sua pena em um sanatório. Duas décadas mais tarde, a Justiça concluiu pela soltura do sujeito por achar que ele restaurou sua sanidade e está apto a ser ressocializado, para desespero de Lila Crane Loomis (Vera Miles, única participante do filme anterior que retornou junto com Perkins), irmã de Marion Crane, a famosa vítima que morreu no chuveiro no filme anterior, que acha que “as pessoas nunca mudam”.
Tendo de volta o seu motel de beira de estrada, Norman tenta retomar sua vida aos poucos, trabalhando numa lanchonete, onde conhece Mary Samuels (Meg Tilly), uma moça com problemas com o namorado, a quem Norman convida gentilmente para passar o tempo que for necessário em seu motel. E é aí que as coisas começam a desabar. Norman passa a receber telefonemas de alguém que se diz sua mãe e começa a receber bilhetes supostamente assinados por sua mãe exigindo que “a vagabunda precisa sair da casa”. E aí começa o processo de degeneração mental do seu protagonista, numa espiral de vertigem que lembra a viagem ao inferno do protagonista de outro clássico do mestre Hitch: Um Corpo que Cai.
A entrada de Mary na vida de Norman é o estopim que desencadeia seu processo de degeneração e retorno homeopático, porém intenso, à loucura e desorientação. Mary é filha de Lila, manipulada pela mãe obcecada a atender seu capricho: mandar Norman de volta ao sanatório. Neste ponto, a narrativa de Psicose II estabelece um paralelo irônico entre o protagonista e sua amiguinha: ambos são manipulados por suas mamães e o filme versa sobre o conflito de ambos em se livrarem dessa influência. Só que as mamães enlouquecem as suas crias que prontamente as obedecem. 
A lenta degeneração de Norman, claro, trará como resultado mais mortes, a começar pela de seu gerente bebum (Denniz Franz, desagradável – no bom sentido – que rouba a cena) que transformou seu motel num prostíbulo de beira de estrada. Entretanto, quando o expectador começa a querer “comprar” o filme, a narrativa surpreende e insere elementos que o jogam em diversas direções. Em um momento, pode-se acreditar que Norman seja o assassino; em outro momento, crê-se que Lila e Mary chegaram a um ponto onde o assassinato começa ser o último recurso para surtar de vez o pobre Norman; em outro momento, tem-se a possibilidade de que uma TERCEIRA pessoa possa estar por trás dos assassinatos e até dos telefonemas e dos bilhetes.
Ao oferecer diversas hipóteses para os vários acontecimentos, Psicose II “convida” o expectador a fazer parte daquele amontoado de eventos que remetem à loucura e aí começa um outro processo de degeneração mental: a do EXPECTADOR!! Psicose II insere elementos, a princípio, desconexos entre si, informações desencontradas e meias-verdades para fazer com que o expectador partilhe da degeneração de Norman e surte junto com o protagonista chegando a um ponto onde pode começar a questionar o que é real e o que é fruto da insanidade de seus personagens.
É essa espiral interativa que torna Psicose II um filme saboroso de ser assistido, dentro do contexto ‘caça níquel’ na qual ele fora concebido. Talvez tenha sido o carinho com o qual o roteirista Tom Holland (que, dois anos mais tarde dirigiria aquele que considero seu melhor filme, o fantástico A Hora do Espanto) e o diretor Franklin tenham olhado para o original e o cuidado no qual devem ter concebido este segundo filme que, se não é melhor que o original (desenvolverei mais disso adiante), continua com dignidade todo aquele universo estabelecido por Hitchcock e, mesmo assim, se utiliza da linguagem típica dos filmes de terror do período, ao mesmo tempo em que renegou seus excessos gerando um filme que é quase a cara do terror/suspense dos anos 80, mas também é diferente de tudo que foi produzido no gênero nesse mesmo período.
Sem querer ser superior ao original, Psicose II desenvolve-se de maneira narrativamente surpreendente para uma seqüência de um filme desse tipo onde as suas personagens ditam o rumo e ritmo dos acontecimentos e não o inverso. É um desses filmes onde quem assiste faz aquela pergunta tão preciosa e rara em muitos filmes hoje “como isso vai acabar?”
Entretanto, por ser cria de uma época em que filmes de suspense/terror eram feitos de maneira ‘fast food’, Psicose II possui seus problemas narrativos que, infelizmente, o afastam de atingir a luz do filme original. Esses problemas concentram-se basicamente no epílogo, onde se soluciona uns 60% dos mistérios relativos à trama. Embora termine-se o filme sabendo quem é o responsável pela maioria das mortes, ainda se fica com a dúvida com relação ao restante das mortes não cobertas pela revelação do assassino, o que é sempre bom. Porém, a revelação em si parece ocorrer mais por exigência do roteiro e não por um desenvolvimento natural e orgânico dos fatos e acontecimentos que levam ao desmascarar do assassino. É como se o responsável por tudo chegasse no final do filme e dissesse ‘Hey, sou eu, eu fiz tudo!!’ Problema idêntico acometeu o primeiro Sexta-Feira 13. A própria idéia de que Norman Bates possa ter tido uma “outra mãe” é também risível e dispensável.
Porém, mesmo após a solução referente a maior parte dos assassinatos, a narrativa volta a flertar com o macabro presente no filme original, brindando a seqüência com uma cena que remete imediatamente ao filme original, fazendo homenagem e introduzindo o expectador de volta ao “status quo operandi” de Norman Bates. Psicose II termina onde o original começa. A sensação de “perda de tempo” pode surgir na cabeça de alguns viewers desatentos, mas acredito que a cinefilia ganhou e muito com o filme, já que o final evita o caminho fácil tão típico dos filmes do gênero, termina de forma angustiante e coloca o expectador diante de uma redenção às avessas, macabra. Para Norman Bates, a sua noção de normalidade é diferente da noção comum do mesmo termo para as outras pessoas. O personagem só encontra paz de espírito na companhia da sua mãe, mesmo que o preço a ser pago seja a sua sanidade e, eventualmente, das pessoas à sua volta.
Tecnicamente, o filme tenta se afastar de seus “primos” do gênero da mesma época. Franklin, exibindo um faro apurado que, até onde eu saiba, não se repetiu em seus filmes posteriores (o cara nunca emplacou no ofício), pinta Psicose II de forma impressionante. Iniciando seu filme com a cena clássica do chuveiro do filme original – opção que, particularmente, não me agrada de jeito nenhum por razões óbvias - o diretor acaba surpreendendo quando mostra pq escolheu a cena em questão para abrir seu filme. Ao soar os acordes da impressionante e insana trilha de Jerry Goldsmith, Franklin nos leva do mundo P&B do filme original, para o Technicolor dos anos 80, de forma gradual, na fotografia de Dean Cundey (colaborador de outrora de Spielberg e John Carpenter), com a casa de Norman ao fundo.
E não pára por aí. O diretor sempre que pode insere planos parecidos com os do filme original, prestando homenagem e fazendo referência. O recado é claro: Psicose II não é só uma seqüência do filme de Hitchcock. É uma HOMENAGEM ao filme clássico, como mostram os créditos finais, ao mesmo tempo em que existe independente deste, técnica e narrativamente falando. Amostras disso há aos montes como a idéia de centrar na casa de Norman Bates 60% dos acontecimentos do filme, fazendo da casa um personagem de trama, com seus corredores, sua escadaria tão bem utilizada no original (e aqui replicada de forma fidelíssima) e mostrando outros detalhes como o banheiro da casa (outra referência ao original), a cozinha, a saída dos fundos, o sótão e mais detalhes do porão. Aliás, o porão rende uma das seqüências mais impressionantes tecnicamente falando (e que, de certa forma, é também uma referência ao original): a morte de um rapaz visto pelo lado de fora da janela do porão, janela essa que também reflete de forma sobreposta, o rosto atônito de sua namorada que a tudo assiste.
A trilha sonora, por sua vez, poderia ter trilhado o caminho fácil que seria repetir o tom da trilha de Bernard Hermmann. Mas Goldsmith adiciona melancolia e uma dose pesada de insanidade e descontrole em sua trilha para ressaltar musicalmente a degeneração mental dos personagens (e, eventualmente a do expectador também). Hermann deve ter ficado orgulhoso.
Por fim, Franklin faz um trabalho que, se obviamente não se compara à sutileza e esmero de Hitchcock, tampouco joga seu filme na vala das seqüências típicas do período em que foi feito. Há ali o nítido interesse em criar um suspense genuíno, proveniente do próprio conceito criado por Hitchcock (a dilatação do tempo, de tudo aquilo que faz o coração palpitar mais forte), através de planos curiosos como o do POV do sótão da casa enquanto se vê, lá embaixo, uma pessoa correndo em direção ao mato.
Psicose II é, em síntese, um achado singular. Gerado como uma seqüência totalmente desnecessária (qual a razão criativa de tirar Norman Bates do sanatório e coloca-lo no motel onde se sabe que – ooooh – mais pessoas morrerão de novo?), o filme é a comprovação de que a FORMA com que é feito, dirigido e montado, faz toda a diferença no produto final em relação à sua premissa. Hitch, se estivesse vivo, deveria ter aplaudido de pé, mesmo com ressalvas.
PRESTE ATENÇÃO: Na atuação milimetricamente calculada de Anthony Perkins. O cara consegue agregar camadas ao seu personagem que qualquer um julgaria impossível, após a conclusão do filme anterior. Sentimentos conflitantes em relação ao personagem não serão incomuns. Aproveite e se delicie.
POR QUÊ NÃO PERDER: Porque é uma seqüência diferente do que se está acostumado a ver. Psicose II continua, na melhor acepção do termo, o filme anterior, acrescentando coisas ao que já havia sido estabelecido no filme anterior deixando aquele universo mais rico, sem repetir as coisas. E o próprio trailer do filme já deixa qualquer um com água na boca:


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Que texto bão, sô!

4/5

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

[Correria para o Oscar 2013] INDOMÁVEL SONHADORA

(Beasts of the Southern Wild, Benh Zeitlin, EUA, 2012)


Um filme com toques de fantasia infantil que flerta com um estilo Mallickiano de ser, este aqui se esbalda em seus 90 minutos mostrando o mundo pelos olhos de uma menina com uma visão singular sobre tudo. Suas falas impulsivas (“quero que você morra e vou no seu túmulo comer bolo de aniversário”) e seus raciocínios diretos, precisos e reais (“todo o universo é feito de várias peças que funcionam juntas; quebre uma e todo o conjunto deixa de funcionar”) fazem o expectador lembrar de quem ele era (ou como deveria ter sido): uma pequena criatura com pensamento definido, ainda que em desenvolvimento, objetivo, sem complicações, ainda que não compreenda plenamente o que ocorre à sua volta, idealista e com um senso de justiça único onde o preto é preto e o branco é branco.

É um filme esquisito e ainda assim poético. Várias cenas são representação abstrata de como a protagonista vê as coisas e lida com temas como vida, pobreza (extrema, aliás), crescimento, perda e morte.

Contudo, gostaria de ter sido mais cativado por este aqui... Talvez seja a correria para o Oscar que faz você assistir ao filme pensando “tenho que assistir mais ‘x’ filmes para fechar a lista”. Isso sem mencionar a câmera tremida e inclinada, ótima para fazer a cinetose de alguns viewers (este que vos fala, incluído) vir à tona, o que pode impactar negativamente na experiência.

De qualquer forma, Indomável Sonhadora engrossa o caldo de filmes extremamente interessantes e diferentes indicados ao Oscar este ano. Fazia muito tempo que a disputa para o careca dourado não ficava tão fascinante como neste 2013.

4/5