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quinta-feira, 2 de agosto de 2012

[Cinema em Casa] BATMAN BEGINS

(idem, Christopher Nolan, EUA, 2005)

Aquecendo para o novo filme do homem-morcego, aproveitei para revisitar os filmes anteriores.

Eu gosto do cinema do Christopher Nolan. Mas devo dizer que o que me atrai mais é justamente a sua capacidade de contar determinados tipos de história do que a forma que ele geralmente as conta. No primeiro aspecto, Nolan me conquista como cinéfilo graças aos seus enredos por vezes intrincados que resultam em revelações quase geniais aqui e ali, nos fazendo pensar nas repercussões daquilo que ele está mostrando e isso fica claro naquele que considero seu melhor filme, O Grande Truque. Já no segundo aspecto, o cara me parece bem expositivo, mais do que deveria, não medindo esforços para fazer seu público entender absolutamente TUDO o que está sendo contado e sair do cinema sem dúvida alguma, como ocorreu em seu penúltimo filme, o intricado A Origem. Talvez seja por isso que o cineasta seja adorado pelo grande público, já que a comodidade oferecida por ele em seus filmes seja extremamente atrativa, afinal, quem é que paga (caro) pra ficar queimando a pestana na sala escura do cinema?

Enfim, no caso de Batman Begins, não há grandes reviravoltas, embora o diretor flerte uma hora ou outra com uma estrutura narrativa não-linear como fez com Amnésia e o já citado O Grande Truque.

Tendo uma missão espinhosa pela frente - apagar da memória do público a péssima experiência promovida por Joel Schumacher com dois filmes horríveis do herói - Nolan se sai relativamente bem. Embora colocar Batman para treinar durante anos no Tibete (!?) seja estranho, focar 1/3 do filme apenas em Bruce Wayne e a sua gradual transformação em Batman que só aparece depois de 1 hora de filme, é um acerto. Nolan também acerta ao abordar o personagem por uma perspectiva mais urbana em uma Gothan City suja, um pouco diferente do cenário gótico bem elaborado por Tim Burton nos filmes de 1989 e 1992. O diretor também acerta em colocar um vilão não caricatural para conduzir a trama e, neste sentido, o ótimo Liam Neeson é peça principal - o que talvez explique sua participação cada vez mais frequente em filmes de ação a partir daqui até hoje - trazendo uma certa "nobreza" ao filme. Neste campo, incluem-se aí a participação de feras como Morgan Freeman, Michael Caine e o mais sumido Rutger Hauer.

Algumas outras idéias são bem exploradas - como a do asilo Arkham ficar dentro de um favelão imundo em uma ilha no meio da cidade, que infelizmente não foi mais explorado e o novo Batmóvel, tirado direto da graphic novel "O Cavaleiro das Trevas" de Frank Miller.

Pra completar, a trilha sonora escrita a quatro mãos por Hans Zimmer e James Newton Howard é nada menos que espetacular, sendo um banquete para cinéfilos como eu, decifrar a participação exata de cada um dos dois nas músicas que compõem a trilha. Zimmer se responsabiliza pelos momentos de tensão, ação e crescendo do personagem ao passo que Howard, como sua especialidade, se concentra nos temas de melancolia que dão o tom do espírito amargurado e traumatizado do protagonista.

Porém, nem tudo são flores. Como dito no início, Nolan se esforça em explicar absolutamente tudo, inclusive cada parte do uniforme do herói tem uma função e uma razão de existir. Curioso tempo esse em que vivemos, onde dizem que o público está mais exigente, quando na verdade esta exigência se mostra pela expectativa não de ver filmes com mais qualidade, mas de ter a trama toda mastigadinha... O cúmulo da exposição narrativa é uma sequência onde Bruce Wayne é confrontado por sua visão egoísta de mundo com um diálogo para lá de óbvio sobre as necessidades da população enquanto o personagem passa por uma quebrada cheia de mendigos, perto do covil do mafioso da cidade.

Como se não bastasse isso, talvez sob pressão de entregar algo que não só os fãs mais hardcore do personagem, mas também o público médio pudesse apreciar, Nolan se entrega sem parcimônia aos diálogos mais pavorosos de sua carreira, certamente cortesia do incompetente David S. Goyer, fãzóide de HQ de carteirinha e co-roteirista junto com Nolan, tais como "você está no inferno, homenzinho... e eu sou o diabo"; "fique calma, você foi envenenada" e momentos de piadinhas deslocadas que mais parecem gags do que algo orgânico destinado a quebrar um pouco da tensão. Certamente o Goyer deve achar que estultices que funcionem no papel de um gibi tem o mesmo efeito em filme. É claro que não tem.

Nolan também mostra uma mão pesada de pedreiro ao relatar a infância do herói, sem sutileza, sem emoção e com um ator mirim ruim de dar dó - a sequência da morte dos pais do Bruce é, inteira, um constrangimento só.

Mas talvez o pior disso seja a visão romântica que Nolan tem deste universo. O diretor parece crer que Gothan City merece sim ser salva. Eu entendo tal postura idealista ser colocada no protagonista - que sim precisa disso para continuar fazendo o que faz, mas penso que neste caso, um impacto dramático maior seria melhor obtido se o diretor fosse cético com relação a isso, não tomando partido, deixando o idealismo apenas para o herói que, mesmo contra todas as probabilidades continuaria lutando pelo que acha ser certo - e estaria aí o verdadeiro heroísmo. Tim Burton raspou nisto, especialmente em Batman - O Retorno mostrando que a esperança de Gothan repousava não nas mãos de um herói mascarado bem intencionado,  mas nas mãos de uma espécie de anti-herói, uma aberração igual aos vilões que combate, quem é tão perturbado quanto toda aquela cidade, o que revela que, na real, a cidade não tem mesmo nenhuma esperança, apenas uma falsa esperança.

De qualquer forma, Nolan, mesmo com este que é seu pior filme (ou "menos bom", como queiram), conseguiu em partes o que queria - apagou da memória o fracasso dos dois filmes anteriores e mesmo com falhas, conseguiu dar uma possibilidade de trajetória digna para o homem-morcego. E isso já é um bocado.

4/5

(revisto em Blu-ray)

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